Introdução: - No
"Dicionário Crítico da Literatura Infantil/Juvenil Brasileira -
1882-1982", a autora Nelly Novaes Coelho faz uma análise da literatura
produzida no Brasil, por brasileiros, destinada às crianças e jovens; nesse
trabalho organizado em forma de dicionário, por autor, ela tem como objetivo
organizar um século de sua existência. Entre eles, Monteiro Lobato é o marco
histórico do nascimento do gênero infantil na Literatura Brasileira.
Abordamos aqui o verbete do referido autor com destaque para as características
da sua obra.
José Bento Monteiro Lobato
(1882/1948) foi uma das figuras que marcou a realidade sócio econômica e
cultural do seu tempo através da nova Literatura Infantil /Juvenil
verdadeiramente nacional, libertando-a do esquema literário importado do Velho
Mundo.
Em carta a Godofredo Rangel, ele expressou ao
amigo suas idéias a respeito da criação de um "fabulário nosso".
Entre 1918 e 1944, Monteiro Lobato desenvolveu farta obra (infantil e
para adultos) onde são ressaltadas as ambiguidades da realidade nacional na
primeira metade do século. Irreverente, ele narra o retrato do país que
conhece: - nasceu no fim do Império, assistiu ao fim da escravidão no país, a
implantação da República, o movimento Modernista (1922), fim da República
Velha, a Revolução de 1930, queda do Estado Novo (1945), redemocratização do
país (1946); a nível internacional: - a 1ª Guerra Mundial (1914/18), a
Revolução Russa (1917), crack da Bolsa de Nova York (1929), Guerra na Espanha
(1936/39), 2ª Guerra Mundial (1939-45), a explosão das bombas atômicas no
Japão, início da Guerra Fria, Comunismo, etc. ..
Sua vida e obra são
influenciadas pela educação positivista progressista que recebeu - o
Super Homem, o Domínio da Vontade o afastaram de outras correntes de
pensamento. De um lado domina o impulso individualista (romântico-liberal), de
outro o pragmatismo norte americano (a sociedade tecnológica progressista), e,
finalmente, a consciência crítica num alerta para os equívocos,
hipocrisias e injustiças vigentes, além das propostas socialistas às quais não
aderiu, e que o Comunismo vinha propondo e realizando desde a Revolução Russa
de 1917. Daí muitas das acusações de "preconceituoso" que lhe foram
atribuídas.
Seu estilo se caracteriza
pela fusão entre o Real e Maravilhoso anulando as fronteiras entre os dois
mundos. Suas estórias são baseadas no mundo cotidiano familiar do dia a dia das
crianças, ao mesmo tempo que evolui de acordo com as leis do
imaginário/maravilhoso. Trata-se de uma evolução lenta que ocorre à medida que
reescreve sua primeira criação "A Menina do Narizinho Arrebitado". O
humor, outro traço de sua literatura infantil, oferece uma nova dinâmica aos
seus contos, que de forma gaiata e irônica, ou de certa familiaridade no trato,
cativa as crianças que mergulham no universo de ficção criado por ele.
Quanto à
linguagem literária, deve-se considerar a época em que Lobato viveu e
a cultura dominante orientada pelo pensamento racionalista do século XIX. Temos
a fronteira bem nítida entre a linguagem culta e a popular, a escrita e a
falada, distinguindo a expressão disciplinada de fala e a fala espontânea.
Nesse ponto ele é um modernista. Seu objetivo passou a ser o de cortar o
supérfluo e dar ênfase ao trama através da inovação da linguagem com a criação
de neologismos, uso da fala coloquial, da onomatopéia, etc.
Sua personagem Emília,
modelo de rebeldia e individualismo, é a única personagem que evolui dentro do
"Sítio do Pica-pau Amarelo"- chave do universo literário infantil
lobatiano. Os demais personagens permanecem símbolos: Dona Benta, a avó ideal;
Tia Nastácia - a serviçal eficiente, afetuosa, humilde, mas querida e respeitada.
Dentro do universo por ele retratado não há nenhum preconceito
racial. Ali está retratada uma realidade do momento. Emília é típico
personagem (mandona) semelhante aos poderosos que manipulam milhões - uma
sátira ao sistema econômico explorador. O Visconde de Sabugosa, Marquês de
Rabicó, o rinoceronte Quindim são arquétipos.
A acusação de que Lobato
seria preconceituoso parte muitas vezes por uma visão distorcida; a leitura
rápida de seu a obra infantil pode suscitar dúvidas, uma vez que a concentração
e o silêncio exigidos para a leitura, nos últimos tempos inexiste. E,
nem todos tem paciência para ler um livro volumoso.
Hoje já não se justifica a
tônica libertária, individualista que visava romper com conceitos da época.
Hoje o importante é a liberdade responsável integrada a um projeto de
vida. Não é nos conceitos literários que as crianças precisam romper barreiras,
e sim, no desequilíbrio econômico e social vigentes. Lobato refletiu a
sociedade e o tempo em que viveu e se opôs ao Sistema. Sua obra é válida como
uma mediadora de um Sistema preconceituoso que deve ser eliminado, superado.
Seu acentuado "aristocratismo" provém dos generosos ideais liberais
que entregavam às minorias esclarecidas a responsabilidade de promover o
progresso social e solucionar os problemas da humanidade.
Monteiro Lobato fez uma
transição do antigo modelo literário para o novo. Sua obra exige uma análise
crítica que estabeleça a sua dimensão dentro de um contexto histórico. Não se
apaga a história.
Mais detalhes na obra citada.
Mais detalhes na obra citada.